Diário de um rumo sem trajecto
As repetições. Ler palavras antigas, deparar-me com a história. A vergonha típica e habitual neste rito.
A vida passa e acontece, e o nosso mundo - que é apenas o nosso mundo - passa e acontece connosco. O amor, aquele, o definitivo, o último, o da vida. A mais pura das certezas.
Somos seres estranhos, nós. Somos corpos com gente dentro, um emaranhado de fios e líquidos que se embaraçam uns nos outros. E a vida pode tornar-nos mais cínicos, mais tristes, mais optimistas, mais confiantes. Ou podemos apenas manter-nos como sempre.
Olho para trás, para o que foi há muito e para o que foi há pouco, e na essência sou o mesmo. Quero o mesmo. A forma muda - é isso que a vida nos faz, tal como aprendemos a escrever melhor ou a tocar melhor, aprendemos a fazer as coisas melhor - mas a Música é a mesma. O riso parvo e exposto já não é exposto mas ainda é parvo. A voz nervosa e irritante já não é irritante mas ainda é nervosa. A luz apagada ainda é uma insegurança, insegurança de ti.
E quem és tu? Quem és tu, massa incorpórea corpo sem rosto rosto sem corpo? Quem és tu, mulher na casa-de-banho, na praia, no cinema, na pista de dança, no camarim, à mesa do restaurante?
As repetições. A vergonha típica e habitual que sei que existirá quando estas palavras cruas e novas já não forem novas mais ainda forem cruas.